domingo, 10 de fevereiro de 2013





15. Papai X Aristênio : Bananas

...e os filhos,retalhos diferentes, no coração da mãe,costurados. 
      
    

Após o almoço, naquele dia, quando conversávamos ainda à mesa, mamãe que se aborrecera com nosso mau comportamento, queixou-se a papai:


- Jesus, estes meninos estão teimosos. Preciso repetir a mesma coisa, uma porção de vezes, para que me compreendam e me obedeçam. Não sei o que está acontecendo com eles.


- Estão crescendo. Fica mais difícil controlá-los.


- Pode ser. Mas acho que estão é desobedientes mesmo.


- Bem. A mim, não desobedecem. Seja firme com eles.


- Mais do que eu sou?


- Ah! Iaci,  não sabes te impor a eles.


Ficamos mudos. Até então, nunca ouvimos nossos pais comentarem qualquer coisa a nosso respeito, em nossa frente. Senti o pé de meu irmão Aécio, pisando o meu pé e depois tocando em meu braço. Entendi que ele me pedia que me comunicasse com Aristênio. Foi o que fiz. Olhei para Tenoca e pisei, com força, em um de seus pés. Ele me olhou, acenou com a cabeça me dizendo sim. Mesmo estando aborrecido por papai dizer que nossa mãe não tinha “moral” para conosco, ele se controlaria. Quem não tem irmãos não sabe como é bom essas comunicações por baixo da mesa, sem que os pais percebam.


Papai nesse dia não nos leu nenhum conto, não brincou conosco. Saiu de casa e a ela retornou poucos minutos depois, trazendo nas mãos onze bananas baiés, nossas preferidas, meio verdosas. Continuávamos na copa conversando com mamãe, como se nada houvesse acontecido. Ele nos chamou:


- Meus filhos, venham aqui um instante. Quero lhes dizer uma coisa. Vejam, estou colocando nesta fruteira onze bananas. Elas estão meio verdosas. Amanhã já estarão maduras. Depois, mais maduras e cheirosas. Nenhum de vocês pode pegar nenhuma delas. Elas apodrecerão aí aonde então. Compreenderam?


...e o retalho pai, comprou onze bananas baiés.

- Papai, por que não podemos saborear estas bananas?



- Porque, Aristênio, elas estão aqui para que tu e teus irmãos aprendam a obedecer. Entendeste ?



- Sim Papai.



Diariamente, naquela semana, papai, após o almoço, contava as benditas bananas e o fazia alto, e lentamente. Notamos que ele queria dizer a nossa mãe que ele estava com a razão: ela não sabia  impor-se a nós.



Passados sete dias, papai, após o almoço, levantando-se da mesa, convidou toda a família, inclusive as moças que trabalhavam em nossa casa e, solene e lentamente, contou as frutas as quais exalavam um cheiro não agradável. Após a contagem, olhou vitorioso para nossa mãe e disse:



- Estás vendo, Iaci, o diabo não é tão feio quanto o pintam. A obediência venceu. Tu me disseste que nossos filhos são desobedientes. Eles obedecem muito bem, a quem sabe mandar, ordenar.



Foi o máximo que Aristênio aguentou. Raciocinava ele: “ será que meu pai não percebe que humilha minha mãe?” então exclamou: 


Aristênio, Barbalha/1946

- O diabo é feio sim, meu pai, mais feio do que o senhor pensa.

- O que queres dizer com isto, meu filho?



- Quero dizer que o senhor foi além da conta. Quero dizer que eu, José Aristênio Landim Luna, comi três destas malditas bananas que todos os dias me insultavam e insultavam a minha mãe.




- Estas mentindo. Todas as onze, que pus na fruteira, estão aqui.


- Não, meu pai. Aí estão onze bananas, entretanto, não são as mesmas   colocadas pelo senhor. Eu comi  três das mais maduras, maiores, mais cheirosas e gostosas e depois peguei a moedinha que minha mãe trouxe na Semana Santa e guardou na gavetinha da mesa do santuário. Fui ao mercado e comprei à Deca, duas bananas iguais àquelas compradas pelo senhor. Elas estão aí, bem à sua frente.



- Mentes, meu filho. Mentes.



- Então, meu pai, vamos juntos ao mercado e perguntemos à Deca. Ela dirá a  verdade para o senhor. O senhor nunca mais duvidará do respeito que temos por  nossa mãe.



Mamãe olhou na gavetinha da mesa do santuário. A moeda que tão zelosamente guardara,  desaparecera.



- Meu filho, tiveste coragem de comprar algo, usando nossa moeda. Nossa moeda abençoada? 


Um tostão.

 Ora, minha mãe, eu não podia mais suportar as contagens diárias de meu pai. A cada contagem, eu estremecia de horror. Ele não sabe quanto nos fez mal. Eu não ia revelar este segredo. Ele me forçou a isto, com suas palavras.



De volta, papai entregou a mamãe sua moedinha que Deca guardara. A quitandeira gorda e risonha, amiga da família, entendera que o menino de seu Dijesus, por pirraça, usara a moedinha da mãe.



Envergonhado, papai se desculpou a mamãe. Esta o olhou bem nos olhos. Depois nos abraçou e nos pediu que esquecêssemos aquela cena desagradável. 



Depois que papai saiu para o trabalho, mamãe conversou com Aristênio. Tentou, como sempre fazia, ensinar-lhe que não tomasse para si seus problemas maternos e de esposa. O filho apenas respondeu:

- Mamãe, está acima de minhas forças. Nunca suportarei que tentem tirar seu brilho. Sou parecido com a senhora, pavio curto, teimoso, mas meu coração é bom como o da senhora.

                                                         
Frutas- principal alimento do Rangó.
Fruta Predileta: banana aliada ao pequi.











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