17. Mamãe, tio
Lourival e a cadela Red
Mamãe
sempre foi muito amiga do tio Lourival Marques. Ele, por sua vez, a admirava e
a respeitava. Os dois se curtiam. Sempre ouvi dizer que ele era fechado,
zangado, de difícil amizade. Aquele que conhecemos era amigo, generoso,
conversador, amável, amigo.
Tia Luci e tio Louvival |
Havia em Barbalha apenas um cão policial
pertencente a Dr Lyrio Callou, marido de tia Cinobelina. Quando este soube de
uma cadela negra da mesma raça do seu cão, em Barbalha, não resistiu. Fez questão de conhecê-la. Tio Lourival achava tudo novo, alegre, acolhedor. E nós nos
orgulhávamos dele, de sua inteligência, de sua conversa, e de saber que fora
ele quem, em nome do povo nordestino se despedira do Padre Cícero, quando de sua morte, através de uma belíssima e decantada crônica.
Quando, nosso tio, indo ao banho, pediu a Red que lhe levasse a toalha, depois os chinelos,
não nos contivemos. Foi o paraíso na terra.
Tendo recebido de nossos pais força
e coragem para realizar seu sonho, perguntou aos mesmos se podia nos presentear
com a cadela. É que, com sua viagem, tia Luci com a filha Vânia e o filho,Igor, passariam a
morar com Mãe Neném até que o tio os pudesse manter na Cidade Maravilhosa. Não havia espaço
para a cadela. Após o fim de semana regressou a Juazeiro.
Mamãe, sabiamente,
esperou dois dias, e rumou para lá. Sentia não ser fácil para tia Lu, permitir
a viagem sem volta, do marido. Como sabia argumentar bem, conseguiu
acalmar nossa tia. O tio viajou. Nós recebemos o melhor presente de nossa vida,
RED.
Parece-me
vê-la. Um animal inteligente, bem treinado, amigo, companheiro. Conosco rolava
pelo chão, conosco brincava e cuidava de cada um de nós. Quando nossos pais saiam
á noite, ordenavam-lhe que não saísse da porta nem permitisse a entrada de pessoa alguma em nossa casa. Podiam demorar-se o tempo que quisessem, ela não dormia
nem se afastava do local determinado. Se algum de nós saísse de sua cama, ela
latia balançava a cabeça e não sossegava até que voltássemos ao lugar onde
estivéramos antes.
Um
dia Dr Lyrio perguntou a nosso pai se ele possuía algum documento comprovando ser a cadela pura de origem. Papai riu e disse que sim. Realmente, o tio lhe entregara o
documento. Então ele propôs cruzarem seu cachorro com nossa cadela. Foi a vez
de papai perguntar-lhe pela documentação de seu cão. E fez disso uma grade
piada. Acertaram os dois que, se nascesse algum cão negro como a cadela mãe,
seria nosso, se algum fosse totalmente branco seria da família da tia
Cinobelina. Se nascessem cães brancos com manchas negras, e apenas um e os
demais filhotes fossem fêmeas, tirariam, na sorte, a quem pertenceria. Uma
espera sofrida. Finalmente pudemos ver os filhotes e, entre eles, um cãozinho
negro como a mãe. Nosso cão. Nosso Rex.
Nada mais nos interessou. Por esta razão não sei se o cão que ficou com Dr Lyrio era branco ou manchado nem, tampouco, o
que foi feito dos demais filhotinhos. Sei, com certeza que, com foi acordado,
apenas dois cães permaneceram em Barbalha, o nosso e o da família da nossa tia.
Red,
era apegada á mamãe. Desfazer-se dela seria muito difícil. Assim papai permitiu
que nosso Rex crescesse ao lado da mãe até se tornar adulto. A separação era
inevitável. Papai, combinando com mamãe, doou-a a Cloves Sampaio.
Este atravessava uma fase difícil de sua vida perseguido por ladrões e assassinos. A Red o
protegeria. E assim o fez. Entretanto, sempre que percebia estarem “as coisas” acalmadas, corria à noite à nossa casa. Arranhava a porta. Mamãe levantava-se de sua cama, abria-lhe a aporta. Uma Red
saudosa se atirava sobre ela e silenciosa deitava-se no tapetinho ao lado da
cama, próximo a nossa mãe. Dormia imediatamente. Aquele era seu lugar de
repouso, sua segurança. Quando acordávamos pela manhã, éramos lambidos,
beijados por ela. Papai avisava a Cloves, da visita inusitada. Ela a pegava e a
levava de volta . Mas aquela entrega despreocupada da Red à mamãe, nos indicava que somente conosco, ela se
sentia livre, protegida, descansada.
Um
dia, em um combate, Red lançou-se á frente do senhor Cloves e a bala a ele dirigida a
atingiu em uma de suas patas traseiras.
Papai solicitou ao amigo que não propagasse a notícia. Sofreríamos muito com a mesma. O senhor Cloves acatou o pedido de nosso pai, mas a Red, não. Tão logo pode, á noite arranhou nossa porta. Felizes pela visita, nos
deparamos com nossa amiga mancando ferida na pata. Choro total. Ante
nosso sofrimento, papai fez novo pedido ao amigo: que levasse a cadela para o sertão ou para um
lugar em que fosse bem tratada. Tal se deu. Nunca mais a vimos. Sua
lembrança permaneceu. Com ela muito aprendemos, e dela nunca esquecemos. Como é
bom para crianças ter animais de estimação em suas casas! São amigos que as ajudam a abrirem-se para relacionamentos ímpares e ricos, em suas vidas.
Tio Lourival e família: > Vânia, tio Lourival e tia Luci . Atrás os dois filhos: Eduardo ( carioca) e Igor ( Juazeirense do Ceará) |
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