domingo, 10 de fevereiro de 2013




           7. Despojamento, 
              vida de Cristo em nossas vidas


... e os pedacinhos catados, retalhos escolhidos e combinados,
  resgataram-lhe a vida. 




Em nossa casa, quando ocorreu o fato a seguir, havia uma sala que chamávamos de “a sala de visita”. Nela, um sofá de madeira com assento em palhinha, duas cadeiras de braço, como poltronas, e mais seis cadeiras, todas com os mesmos detalhes do sofá.


Era moda na época, falava-se bem da dona da casa que trazia seus móveis da sala de visita “vestidos com capas” bordadas à máquina, ou sem bordados. Importava que as mesmas fossem brancas, impecáveis. Por isso, tínhamos três conjuntos de cobertas, sempre limpas, engomadas, guardadas em gavetas perfumadas.


A primogênita  de nossos avós maternos, tia Elcídia, quase onze anos mais velha do que mamãe, casara-se com um promissor comerciante de Santana do Cariri. Após o casamento, para horror e desgosto da família Maciel Landim, o mesmo mostrou um lado escuro de sua personalidade.

Elcídia, criada com regalias, dada a ótima situação financeira dos pais, artista nata, amante do canto, da dança, da pintura, e, sobretudo da música, não pode suportar a “tirania” do marido. Partiu muito jovem para a casa do Pai. Seus filhos, Nilson, Anatole, Ena e Ivan ficaram com o pai da terra que,  após algum tempo da perda da esposa, perdeu também, por fatos que não cabe aqui relatar, a  grande fortuna amalheada.



Família Maciel Landim,( primeiros filhos) 

                 Da esquerda para a direita: Maria, dama de companhia, Elcídia, Jossel, Elnísio,
                       José Batista Landim, Bárbara Maciel Landim (Neném Landim) e  Elvídio.                                                                                                  

                                     .
                                   
                                                                        Família Maciel Landim(últimos filhos)                                                      
                                                         >Emir, Nair, Elísio, Maria Iaci e Luci.  



Nilson, o primeiro filho, inteligência privilegiada, percebendo não  mais poder contar com a ajuda do pai para pagar-lhe os estudos, concorreu a uma bolsa, incluindo internato, junto a um dos melhores colégio católico do Rio de Janeiro. Prestado o concurso, não tendo como se manter na Cidade Maravilhosa, retornou ao Cariri onde foi notificado que obtivera o tão sonhado prêmio. À auspiciosa notícia, os  padres diretores juntaram uma lista contendo tudo aquilo que o futuro aluno devia providenciar para que fosse aceito no internato. A falta de um só dos itens, redundaria em corte, em perda da merecida bolsa.

Apavorado, correu, como sempre o fazia, para a casa da tia Iaci. Esta e o marido percebendo  a aflição do sobrinho, sossegaram-no. Arcariam com as despesas. A bolsa, não a perderia. O tempo era pouco como pouco também  era o capital de que dispunham. Acreditavam, porém, que conseguiriam atingir a meta a que se propunham.


Papai, como sempre fazia, transformou o momento de tensão em piada. Rindo, mostrava a lista aos amigos e dizia: “este rapaz levará em sua bagagem mais tecidos do que aqueles das lojas de nossa cidade. Que padres sabidos! Nenhuma noiva ou noivo que eu conheça preparou para si tão grandioso enxoval. Se o rapaz permanecer 10 anos no internato não usará o que eles exigiram. Isto que enviaram não é uma lista e sim uma comprida e sofrida ladainha. Os danados estão tão acostumados a introduzir novas invocações as ladainhas, que o fazem  com tudo o que listam. E os pais dos alunos que  se virem". Mamãe ouvia quieta suas apreciações e depois solicitava-lhe mais ajuda para a compra dos decantados itens.



A data estipulada  para a entrada do Nilson no internato se aproximando e     a lista incompleta gritando, cobrando providencias. O que fazer? Não era prudente retirar mais dinheiro de seu comércio, a Sapataria Boa Fama.  Se o fizessem correriam o risco de mexer no capital de giro e necessitarem pedir empréstimos com juros escorchantes.

Os dois, porém, não se deram por vencidos. Papai planejou vender algumas de suas vacas, comprar o bilhete da passagem,  dar ao rapaz o dinheiro referente a compra de móveis  (cama e escrivaninha), bem como para os gastos na viagem. Mamãe achou por bem pedir-lhe que encerrasse as "conversas engaçadas"  com os amigos. Temia que as mesmas chegassem aos ouvidos da família.  Não queria que Nilson soubesse quão sobrecarregados estavam seus tios, pela ajuda solicitada, nem desejava ver ruir o sonho do promissor sobrinho. Ouvira-o, seguro, repetir tantas vezes   que pretendia ser  o melhor aluno do colégio, que  sempre obteria a maior nota em todas as disciplinas, que absorvera em si aquelas afirmações como verdades. Faltava tão pouco do muito solicitado, que “até um milagre poderia acontecer"...

Mamãe, nos tempos de solteira, Associada das Filhas de Maria, amava profundamente a Mãe do Céu, a Cheia de Graça, e buscava tê-la sempre presente em sua vida. Em suas aflições, dores, angustias, incertezas a ela recorria acreditando que, se fosse da vontade de Deus, seria atendida. Invocava-a como a MÃE DO PERPÉTUO SOCORRO. E sempre que a ocasião lhe parecia propícia, procurava transmitir aos filhos aquela certeza que guardava em si: “Ela está sempre, perpetuamente, escutem bem,  perpetualmente, a todo instante, sem se cansar ou desistir, intercedendo pelos filhos e pelas filhas. Nunca a ela  recorri em vão.” E nos fazia repetir: “Vinde me meu socorro, ó mãe carinhosa!"





                                                    
                                   
Nossa Senhora do Perpétuo Socorro







Vinde em Meu Socorro, ó Mãe Carinhosa!”  Com esta invocação minha mãe adormeceu naquele noite. Na manhã seguinte abriu as gavetas onde guardava as formidáveis capas, todas em percal ou linho e as transformou em lenços, cuecas, lençóis e um mundaréu de coisas mais. Enxoval perfeito, completo. 

  

As cadeiras desnudas chamavam a atenção de suas amigas bem como a de suas  freguesas  que a interrogavam. Respondia-lhes: “A Mãe do Perpetuo Socorro prefere que os tecidos garantam a entrada de meu sobrinho no Colégio.” E nunca mais cobriu as referidas cadeiras.


Maria Iaci era assim, formidavelmente despojada. Nunca suportou ver alguém sofrendo sem lhe prestar socorro. Nesta escola os Landim Luna foram educados.


Landim Luna


Os quatro Maciel Landim: Elvídio,Jossel, Elnísio e Elísio. Filhos de José Batista Landim e de Bárbara Sobreira Maciel ou Bárbara Maciel Landim ( DONA NENÉM LANDIM)


Elvìdio Maciel Landim, inteligência
privilegiada. Coordenador do IBGE.
    
 
Jossel Maciel Landim,Oficial
da Marinha Mercante Brasileira
Elnìsio Maciel Landim
> Jossel e Elísio Maciel Landim

SONETO ANTIGO

Responder a perguntas não respondo.
Perguntas impossíveis não pergunto.
Só do que sei de mim aos outros conto:
de mim, atravessada pelo mundo.

Toda a minha experiência, o meu estudo,
sou eu mesma que, em solidão paciente,
recolho do que em mim observo e escuto
muda lição, que ninguém mais entende.

O que sou vale mais do que o meu canto.
Apenas em linguagem vou dizendo
caminhos invisíveis por onde ando.

Tudo é secreto e de remoto exemplo.
Todos ouvimos, longe, o apelo do Anjo.
E todos somos pura flor de vento.

Cecília Meireles

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