domingo, 10 de fevereiro de 2013

2-PROCURANDO SUA AMADA





                2.  Jesus Luna a procura de sua
              amada                          



...retalhos costurados, sol fundindo-se com estrela.
                                                       

O moço bonito do Sítio Farias, da localidade de Cajazeiras em Barbalha, Jesus Cruz Luna, buscou, tão logo se deu conta, a mulher que o completaria.

Traçou, com o coração e a inteligência, seu retrato. Retrato do corpo e da alma. Sabia que somente com aquela que idealizara, seria feliz.

A moça de seus sonhos, devia ser: aberta á vida e despojada, alegre mas não ruidosa, inteligente e simples, criativa sem ser apresentada, temente a Deus e sem carolices. Sua pele não poderia ser branca, preferia uma morena clara de olhos de mel, cabelos castanhos, boca rosada, olhos falantes, porte de rainha sem se apegar à coroa, delicada mas decidida, nova sem ser criança, bela de uma beleza que combinasse com a sua, altura mediana, que soubesse pisar bem, quando de salto alto. Inteligente, criativa e discreta e, sobretudo, que soubesse entender e respeitar as pessoas tal qual são, sem impor regras ou restrições.

Já quase aos trinta anos entrando, seus pais pensavam que nunca se casaria. Desdenhara “os melhores partidos” de Juazeiro, Crato Barbalha e Missão Velha. Os pais cansados estavam de  apresentar-lhe possíveis namorada, noiva ou esposa.  “Quem ele pensa que é, para procurar entre as mulheres, a desejada, aquela de seus sonhos?” Indagavam-se dona Anginha e o professor Otoniel, seus pais. Ele manteve-se firme em seu propósito. E, em um certo dia, quando já instalara sua empresa em Barbalha, viu em Juazeiro do Norte a mulher sonhada, a desejada. 

De blusa branca e saia godê, de um róseo-avermelhado, destacava-se na multidão que conduzia o andor de Nossa Senhora. 


Uma fita azul com uma Medalha Milagrosa repousava  em seu peito. Ele parou e, alegre pala surpresa, acompanhou a procissão.



Precisava saber quem era aquela moça bonita. Onde morava. Como vivia. Naquele dia, nada soube dela. A moça, acompanhada de amigas, deteve-se na sorveteria. Pode gravá-la bem na memória e avaliar sua postura. AMOU O QUE VIU.


Maria Iaci ladeada por duas amigas
Juazeiro, Ceará/ 1935

/"Saberei aonde encontrá-la", pensou acertadamente. "Na Igreja Martiz de Juazeiro, com certeza, estará no próximo domingo. Lá eu a verei".

Voltou para Barbalha despreocupado e contente. No domingo seguinte, participou de todas as missas da manhã, na Igreja Matriz de Juazeiro. Na última, a viu. Agora, pensou, saberei quem é ela. Após a missa,  seguiu-a. Quando a viu entrar em sua casa, anotou o número  e o nome da rua.

Maria Iaci Maciel Landim/1934
                                                       
                                            
 A um amigo discreto, perguntou se a conhecia. Ele  respondeu-lhe que sim. “É a filha mais velha de seu Landim. Mas ‘tire seu cavalinho da chuva’ camarada, ela é indomável. É lindíssima, mas não sabe disso. Não é de muita conversa. Trabalha e é a luz em sua casa. A ‘um pé de valsa’ como você, não se dignará dar uma só olhadela, e se você pensa em namorá-la, está perdendo seu tempo.”
        
Na semana seguinte, todos os dias, após fechar a sapataria em Barbalha, ia a Juazeiro para registrar os hábitos daquela família. 


Em uma dessas "vigílias", viu dona Neném( Bárbara Maciel Landim) e as filhas, Maria Iaci, Nair, Emir e Luci, bem como a ajudante e amiga da casa, Carmina, saíndo de casa. Percebeu que outras pessoas a elas se juntavam. Encaminhavam-se à casa da madrinha Ritinha e do tio Josias para a festa da Renovação do Sagrado Coração de Jesus e o de Maria. A reza, seguida de foguetório e de merendas, seria as sete horas daquela noite.

Não pensou duas vezes. Tinha que aproveitar a chance que se lhe apresentava. Bateu à porta da casa e José Batista Landim, o chefe da família, meio desconfiado, o atendeu: 


                  José Batista Landim/ 1941, Juazeiro-Ce.                 
Quem é o senhor? O que deseja em minha casa a esta hora  da noite? Se é caso político que o traz aqui, não abra a boca. Desapareça. Desde que meu compadre e amigo, Doutor Floro Bartolomeu deixou este mundo, não me meto mais com política.

- Seu Landim, o assunto que me traz aqui é outro bem diferente. O senhor permite que em sua casa, eu entre?

- Antes, moço, diga-me quem es.

Meu nome é Jesus Cruz Luna. Sou barbalhense, filho de barbalhenses. Trabalhei por um tempo aqui em Juazeiro com meu cunhado, Antônio Mariano.

- Ora mais essa! Antônio Mariano é meu amigo. Entra rapaz. Diga-me o que te traz a minha casa.
Depois de confortavelmente sentados em cadeiras da sala de visita, Jesus revelou a José Batista Landim o porquê de sua visita. 
- Seu Landim, eu vim hoje aqui pedir sua filha Iaci em casamento.

- Iaci? Estás brincando? Maria Iaci, moço, nunca nos falou sobre casamento, noivado ou namoro. Ela não é dada a namoricos.

- Eu sei, seu Landim. É por isso mesmo que a quero para minha esposa. Ela é minha namorada. E mais, estou apaixonado por ela. 

- Iaci, Jesus, nunca nos escondeu nada. Temos um relacionamento aberto. Agora vens com essa história de  casamento  e me dizes que es  o namorado dela? 

- Desculpe-me, o senhor me entendeu mal. Eu não sou o namorado de sua filha. Ela nem me conhece... Eu sim, eu a namoro e afirmo que ela é minha namorada e  que quero me casar com ela.

- Não te entendo bem, rapaz. É uma história complicada esta tua. Necessito de uns minutos para absorvê-la...Minha filha, Maria Iaci, é tua namorada. Tens certeza disto?

- Tenho sim. Tenho certeza absoluta.

- Entretanto, não es o namorado dela. Ela não se enamorou de ti.

Olhando para Jesus, desabou numa alegre gargalhada. O rapaz, calado, esperou que o pai da mulher amada terminasse seu desabafo. Enxugando as lágrimas, seu Landim pediu:

- Conta-me, Jesus, como conheceste minha filha.

- Conhecer, conhecendo, falando, discutindo, ouvindo, nunca a conheci. Conheci-a através de sonhos, de buscas, de procuras. Eu sei, com certeza, que nós dois nascemos  um para o outro.

- Não acredito nisso. Percebo, porém, que queres realmente,  casar com minha filha. Preciso, portanto, falar-te sobre ela. É uma mulher linda de corpo e de alma. É generosa, ativa, criativa, trabalhadora e muitas coisas boas mais. É maravilhosa, uma filha que todo pai deseja para si. Entretanto, tem um gênio danado. Eu a comparo a um cavalo selvagem. Não se deixa domar. É teimosa quando pensa que está certa em suas afirmações. Tem ânsia de liberdade. Acho que  não fazes um bom negócio casando-te com ela.

Foi a vez de Jesus gargalhar.

- Seu Landim, o que mais me encanta nela é sua forte personalidade. Hoje, peço sua permissão para me casar com ela.

- Estás   me parece muito seguro. E se ela não te quiser, não te aceitar?

- Tenho certeza que me aceitará. Tão logo o senhor ma conceda em casamento, eu a conquistarei. Eu, seu Landim, procurei-a por todos os lugares e a encontrei numa procissão.

José Batista Landim rendeu-se àquele rapaz que amava sua filha, que reconhecia nela os dons, a alma forte, reta e pura. Entendeu que o moço necessitava de sua ajuda. Levantando-se abraçou-o dizendo:

- Meu maior tesouro, eu o deposito a teus cuidados. Iaci é dessas mulheres que magoada, prefere morrer. Cuide bem dela.

Retornando á Barbalha, Jesus partilhou com sua mãe, Ângela Luna, dona Anginha, que encontrara, finalmente, a mulher que tanto procurara. Informou-a que já acertara com o pai da moça, o casamento. Pediu-lhe que o ajudasse a conquistar a noiva arrumando numa cestinha, lindas e vermelhas romãs do sítio da irmã de seu pai, tia Sinobre, entremeadas com jasmins ou rosas brancas, porque este seria o primeiro presente seu para sua amada.                            
                            
                                                                                
                        
A cestinha chegou ao seu destino. O presente se repetiu por três vezes. Seu Landim nada comentou. Aguardou a reação de Maria Iaci bem como o a da esposa e das demais filhas. Iaci nem desconfiava que para ela, as mesmas se destinavam. 
                                                                                                   
Casaram-se onze meses depois, no dia 30 de novembro de 1935. Maria Iaci e Jesus Luna se deram um ao   outro inteiramente, incondicionalmente.


Depois do primeiro filho, Carlos Aécio, chegou-lhes uma menina pequena, franzina. Seu Landim a amou com amor de avô e de pai. Aquela neta de cabelos finos, pequenina , indefesa que o olhava com olhares de encantamento, tocou fundo seu coração. Amou-a e mimou-a sem restrições. Nela derramou-se por inteiro. Inocente, carente, sem saber o porquê, do avô, o oásis, a menina passou a ser.

Carmem Aide


Vem meu amor não demora
Vem...
Perfumar nossas manhãs
com cheiro de jasmim e de belas rosas,
com gosto de fazenda carinho
de maçãs e frutas saborosas.
Há vem...
Fazer oferendas a tua Deusa do amor!
Vem ofertar ao sol se por
como alimento para
entre beijos roubados com 
as delícias das
romãs. Vem não demora!

Vem fazer de mim tua taça.
Com líquido inquieto,
infusão apurada o teu ato de graça.
Vem ser minha coroa a qual sou fiel...
Faz-me de rainha que te faço alteza.
Vem ser todo céu...
Vem tomar o espaço que é da mãe natureza.

Vem não demora...
Faz de mim tua amante.
Tua estrela cigana teu
talismã ofegante.
Vamos...? Fazer de nossas
vidas sol fundindo-se com estrelas?
Vamos levar todos os 
rios rumo as cachoeiras?
Vem não importa como...
Só não esquece minhas rosas
vermelhas.

Marisa Torres


      "Quando  eu não te tinha
 Amava a natureza como um monge calmo a Cristo...
      Agora amo a natureza como um monge calmo a Virgem Maria...
Religiosamente, a meu modo, como antes,
Mas de outra maneira, mais comovida e mais próxima...
Vejo melhor os rios quando vou contigo
Pelos campos à beira dos rios;
Sentado a teu lado reparando nas nuvens
Reparo nelas melhor...
Tu não me tiraste a natureza...
Tu mudaste a Natureza...
Trouxeste a Natureza para o pé de mim.
Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais,
Porque tu me escolhestes para te ter e te amar,

Os meus olhos fitaram-na mais demoradamente
Sobre todas as coisas.
Não me arrependo do que fui outrora
Porque ainda o sou..."


   Fernando Pessoa

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